Nova tese sobre o Tema 995 considera má-fé e isenta veículos de punição por entrevistas ao vivo, mas determina direito de resposta proporcional
Os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) chegaram nesta 5ª feira (20.mar.2025) a um consenso sobre os critérios para responsabilizar os veículos jornalísticos por declarações de entrevistados. A Corte analisava os recursos sobre o Tema 995, que tem repercussão geral e deve ser seguido por outras instâncias da Justiça.
A nova tese é mais específica e restringe a sua aplicação a casos em que um entrevistado atribui falsamente crimes a outra pessoa. Também houve modificações sobre a possibilidade de responsabilização por entrevistas transmitidas ao vivo. O Supremo definiu que nesse caso, não cabe punição, mas deve ser dado o direito de resposta proporcional.
A principal diferença entre a tese original e a nova é a especificação dos casos em que um veículo jornalístico pode ser responsabilizado. No texto de 2023, um jornal, por exemplo, poderia ser considerado culpado se houvesse indícios concretos de falsidade na declaração do entrevistado, já no momento da publicação. Também seria responsabilizado o veículo que não tivesse observado o dever de cuidado na apuração e divulgação do conteúdo.
Segundo os recursos apresentados, a redação, como estava, era subjetiva sobre a questão central: quando um entrevistado atribui falsamente um crime a outra pessoa. Alegavam que abria uma brecha para que a tese fosse aplicada de maneira errada por outras Instâncias, correndo o risco de censura.
O texto de 2025 foi alterado para especificar a situação. A responsabilização será feita quando for comprovada má-fé. A tese considera duas situações em que isso pode ocorrer:
se ficar comprovado que o jornal tinha conhecimento prévio de que a fala do entrevistado carregava informação falsa; e
quando houver negligência na apuração das informações e exposição do contraditório ou quando o direito de resposta não for assegurado ao terceiro citado pelo entrevistado.
Como novidade, a tese traz critérios para diferenciar entrevistas gravadas das transmitidas ao vivo. No 2º caso, isenta o jornal pelas declarações do entrevistado, mas estabelece que deve ser assegurado o direito de resposta “em iguais condições, espaço e destaque”, sob pena de responsabilidade.
Também determina a remoção de conteúdo falso que ficar disponível em plataformas digitais, mediante ofício ou por notificação da vítima.
A Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), autora de um dos embargos de declaração que suscitou a definição da nova tese, enviou sugestões ao Supremo para aperfeiçoar a redação. A associação alegava que o texto era subjetivo e abriria espaço para ser aplicado de maneira equivocada e inconstitucional, violando a liberdade de imprensa.
Os advogados que representam a associação no caso elaboraram um quadro comparativo entre a tese inicialmente fixada, as alterações feitas pelo relator, ministro Edson Fachin, em seu voto e as sugestões da entidade.
Leia um resumo de como era e como ficou o Tema 995:
definição de quando admitia-se a responsabilização:
pelo que o jornal poderia ser responsabilizado:
especificações sobre entrevistas ao vivo:
especificações sobre remoção de conteúdo:
Em nota, os advogados Beatriz Logarezzi e Igor Tamasauskas, do escritório Bottini & Tamasauskas Advogados, reconheceram avanços no texto final, mas apontaram dúvidas quando se trata de remoção de conteúdo. Dizem não estar claro como deve ser constatado que o crime falsamente atribuído a 3º por entrevistado é, de fato, falso.
Afirmam que é necessário tomar cuidado para que a remoção de conteúdo “se enquadre, exclusivamente, nas hipóteses legais, sem que haja cobranças abusivas de retirada de conteúdo que violem a liberdade de imprensa”.
Leia a nota Beatriz Logarezzi e Igor Tamasauskas:
“Considerando a maneira como as instâncias inferiores vinham aplicando, equivocadamente, a tese antes fixada no Tema 995/STF, a redação proposta na sessão de hoje foi um avanço para o livre exercício do jornalismo profissional.
“Isto porque havia um trecho – agora suprimido – que tratava da responsabilização dos veículos de comunicação em termos mais gerais, dando brecha para que a tese fosse aplicada em casos sem relação com a discussão feita no STF, que é restrita a casos em que é veiculada entrevista com imputação falsa de cometimento de crimes. Ao remover este trecho, o Supremo demonstrou a sua preocupação com responsabilizações que podem violar a liberdade de imprensa e considerou, felizmente, algumas das importantes questões trazidas pela Abraji.
“O consenso em excluir das hipóteses de responsabilização as entrevistas ao vivo é também de suma importância. Não há possibilidade fática dos veículos, simultaneamente, deixarem de veicular eventual imputação feita ao vivo ou sequer de averiguar a sua veracidade.
Importante que fique claro, no entanto, que não se pode imputar responsabilidade a um veículo que divulga uma imputação falsa, mas que realiza, também, uma ressalva quanto à falsidade da imputação. Nestes casos, não há como ser caracterizado o dolo ou a culpa grave – e é o que esperamos que as instâncias inferiores reconheçam.
“Algumas dúvidas, no entanto, surgiram com relação ao terceiro item, relativo à remoção de conteúdo. Não ficou claro a partir de quais meios deve ser “constatada a falsidade” da imputação. É preciso tomar cuidado para que a remoção de conteúdo se enquadre, exclusivamente, nas hipóteses legais, sem que haja cobranças abusivas de retirada de conteúdo que violem a liberdade de imprensa.
“A Abraji ainda publicará nota completa com todas as suas considerações acerca do Tema 995/STF.”
JULGAMENTO
Na sessão plenária, o presidente do Supremo, Roberto Barroso, afirmou que os jornais só vão responder por danos morais em caso de dolo ou culpa grave. “Em regra geral, o veículo não é responsabilizado por entrevista dada por 3º”, declarou.
O ministro Flávio Dino deu parabéns ao relator do caso, ministro Edson Fachin, pelo trabalho na elaboração do texto com as sugestões dos ministros e afirmou que a nova tese marca a “vitória do liberalismo político”.
“Quero homenagear o eminente relator, ministro Edson Fachin, porque no curso do julgamento nós todos fizemos sugestões, dentre os quais, eu mesmo estava com pedido de vista e não precisei exercê-lo exatamente pelo espírito de vossa excelência e também do ilustre presidente. Contra as teses iliberais que graçam por aí, o Supremo aprova uma tese que marca a vitória do liberalismo político, como nós vimos”, declarou.
O Supremo havia suspendido o julgamento dos embargos de declaração contra a Tese 995, fixada pela Corte em novembro de 2023, depois que Dino pediu vista (mais tempo para análise).
Pela regra, o ministro que pediu vista retomaria o julgamento com a apresentação do seu voto. No entanto, como o colegiado entrou em consenso, houve só a proclamação do novo texto.
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