Participação da Selic na dívida pública vai ao maior nível desde 2006

Débitos indexados à taxa básica de juros são 42,6% do total e somam R$ 3,8 trilhões; Banco Central está em ciclo de aperto monetário

A parcela da dívida mobiliária federal atrelada à Selic atingiu 42,6% no acumulado até janeiro de 2025. Esse é o maior patamar de participação da taxa básica de juros no endividamento público desde abril de 2006, quando era de 43,0%.

O Banco Central publica os dados todos os meses. A série contabilizada pela autoridade monetária começa em 2000 e considera as operações de mercado aberto. Entre todos os anos, o auge do peso da Selic na dívida pública foi em junho de 2003, com 62,7%. 

Especialistas afirmam que os títulos públicos atrelados ao juro base se valorizaram por causa do aperto monetário e pela instabilidade dos mercados de risco. 

Leia a trajetória da participação:

A dívida pública é o montante que o governo deve por causa de empréstimos tomados. É maior em situações de deficit primário, quando os gastos superam a arrecadação. 

Para captar recursos, emitem-se títulos comprados por diferentes financiadores –como bancos, fundos de pensão, investidores institucionais, estrangeiros e cidadãos brasileiros.

Os papeis têm prazos e rendimentos acordados, e muitos deles são indexados à Selic. Quem investe tem ganhos por meio de juros.

Regulada pelo Banco Central, a taxa básica está em 14,25% ao ano e deve continuar subindo por um tempo. A autoridade monetária está em processo de aperto monetário para controlar a inflação.

O valor nominal das dívidas emitidas indexadas à Selic é de R$ 3,8 trilhões. No total, a dívida bruta do Brasil é de R$ 8,9 trilhões.

Leia o histórico:

O QUE EXPLICA O AUMENTO

Especialistas dizem que o aumento da participação da Selic na dívida pública se explica por alguns fatores centrais:

valorização – o processo de aperto monetário intensifica a busca por papéis ligados à taxa básica;
outros títulos em baixa – os juros em alta levam outras categorias de financiamento à desvalorização, como os atrelados à inflação. Assim, a participação da Selic no total aumenta;
cenário fiscal incerto – o mercado de investimentos está instável. As políticas externas e as dúvidas sobre o compromisso do governo com o equilíbrio das contas públicas trazem volatilidade aos principais índices. Os investidores preferem apostar no baixo risco, como é o caso dos títulos federais.

“As dívidas atreladas à Selic, de curto prazo, vão se valorizando mais rapidamente. Vão ocupando um pedaço maior do bolo. Então, tem um próprio desenho mecânico aí”, disse ao Poder360 Filipe Ferreira, diretor de Negócios do terminal financeiro Comdinheiro. 

2016 X 2025

Esses 2 anos tiveram a Selic em patamares mais altos, como mostra o gráfico abaixo:

Apesar disso, a parcela da Selic na dívida mobiliária federal não está no mesmo nível. Ocorre que a condução da política monetária em ambos os anos se deu de formas diferentes. 

O ano de 2016 foi marcado pelo final do governo de Dilma Rousseff (PT). 

O Banco Central daquela época subiu os juros na tentativa de frear o aumento dos preços. A alta foi de aproximadamente 7% ao ano para 14,25% ao ano em alguns meses. O impeachment da petista levou a um processo de ajuste nas contas públicas, o que auxiliou no controle inflacionário e levou a Selic a baixar.

“Naquele momento, o mercado projetava queda nos juros com a mudança de governo e o ajuste fiscal que se anunciava. Isso permitia ao Tesouro emitir mais títulos prefixados e atrelados à inflação, mesmo pagando um prêmio elevado”, disse Tsai Chi-yu, CEO da fintech Stay e ex-trader de derivativos na empresa de serviços financeiros Morgan Stanley.

Já o cenário atual é mais turbulento. Os juros diminuíram drasticamente durante a pandemia na tentativa de movimentar a economia. O fim da crise sanitária levou a uma alta na inflação –e um aperto súbito da Selic. 

Começou-se um processo de flexibilização nos juros em 2023. O mercado esperava a taxa básica abaixo de 2 dígitos ao final do ano seguinte, por exemplo. Isso não se concretizou e os juros voltaram a subir por fatores como alta no câmbio e temor fiscal.

“A conjuntura fiscal mais frágil, a instabilidade política e a volatilidade macroeconômica limitam o apetite dos investidores por risco, forçando o Tesouro a emitir mais pós-fixados para conseguir financiar o governo”, declarou Tsai Chi-yu.

TESOURO: DESVINCULAR DA DÍVIDA É “SAUDÁVEL”

O secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, defendeu que diminuir a participação da Selic na dívida pública é uma escolha “saudável”. Segundo ele, é mais interessante ter títulos com taxas pré-fixadas –aquelas com índices definidos antes.

“Quanto mais a composição da dívida for atrelada a títulos pré-fixados, a índices de preços, desvinculada da taxa de curto prazo que o Banco Central utiliza para regular o mercado e atingir os objetivos do processo inflacionário, melhor. Isso é saudável”, declarou Ceron em entrevista ao Poder360 em 9 de outubro de 2024.

Apesar de ver o impacto da alta do juro base, Ceron disse esperar que o endividamento fique estável em aproximadamente 82% do PIB. O secretário afirmou na época que o objetivo é possível “sem dúvida”.

A DBGG (Dívida Bruta do Governo Geral) fechou 2024 aos 76,1% do PIB. Subiu 2,2 pontos percentuais no ano passado e 4,4 pontos percentuais no governo Lula.

Fonte: https://www.poder360.com.br/poder-economia/participacao-da-selic-na-divida-publica-vai-ao-maior-nivel-desde-2006/

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