Entenda como o 7 de Setembro se voltou contra Bolsonaro

Quando ocupava o Planalto, político do PL usou data para demonstrar força; atitudes e discursos se tornaram peças centrais para processo de inelegibilidade e ação penal por tentativa de golpe

O 7 de Setembro, principalmente em 2021 e 2022, foi determinante para os destinos político e jurídico de Jair Bolsonaro (PL). Manifestações de seus apoiadores no Dia da Independência daqueles anos –com a presença do então presidente– foram incorporadas a processos eleitorais e criminais contra o político do PL.

Em 2025, Bolsonaro não vai para a rua na data, como fez na 2ª metade de seu mandato no Palácio do Planalto. Está em prisão domiciliar, usando tornozeleira eletrônica e impedido de usar as redes sociais ou “pré-fabricar” conteúdos que possam ser usados na internet a fim de interferir em seu julgamento, em curso no STF (Supremo Tribunal Federal).

Bolsonaro e outros 7 réus devem ser julgados sob acusação de 5 crimes, entre eles tentativa de golpe de Estado, até 6ª feira (12.set). Tudo indica que a 1ª Turma do STF caminha para condenar o ex-presidente, mesmo diante de protestos de seus advogados, para quem há cerceamento do direito de defesa e ausência de provas.

O processo criminal traz mensagens privadas com intenções golpistas trocadas entre auxiliares de Bolsonaro. Traz minutas de decretos elaborados para cancelar a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2022. Traz até planos secretos de assassinar Lula e outras autoridades, como o ministro do STF Alexandre de Moraes. Mas traz também atitudes públicas de Bolsonaro, parte delas nos atos de 7 de Setembro de 2021 e 2022..

Processo de inelegibilidade

O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) tornou Bolsonaro inelegível por 8 anos ao condená-lo, em 30 de junho de 2023, por uso da máquina pública por causa de uma reunião com embaixadores estrangeiros realizada em julho de 2022, na qual afirmou sem provas que o sistema eleitoral brasileiro poderia ser fraudado.

Em 31 de outubro de 2023, o TSE julgou outro caso. E chegou à mesma decisão. O tribunal condenou de novo Bolsonaro por uso da máquina pública por transformar as comemorações do 7 de setembro de 2022 em um evento de campanha, a 1 mês de sua tentativa frustrada de reeleição. A decisão reafirmou sua inelegibilidade por 8 anos –a pena não foi somada à anterior.

No Dia da Independência de 2022, Bolsonaro discursou em um carro de som depois do desfile militar. Ele não citou as urnas eletrônicas ou o sistema eleitoral brasileiro, mas convocou seus apoiadores para votar nas eleições. “Vamos todos votar, vamos convencer aqueles que pensam diferente de nós, convencê-los do que é melhor para o nosso Brasil”, disse.

Durante o seu discurso, o então presidente puxou o coro de “imbrochável” para si mesmo. Outro fato que marcou o evento foi o desfile de tratores na capital federal em apoio à candidatura. O desfile foi organizado pelo Movimento Brasil Verde e Amarelo e marcava o apoio do agronegócio a Bolsonaro.

Horas depois, Bolsonaro seguiu para o Rio de Janeiro, onde participou de uma manifestação e discursou em um trio elétrico na orla de Copacabana.

Vinícius Nunes/Poder360 – 7.set.2022

Apoiadores exibiram cartazes pedindo que Bolsonaro e as Forças Armadas destituíssem os ministros do STF

Relatório da Polícia Federal

O relatório da Polícia Federal no inquérito sobre a tentativa de um golpe de Estado depois das eleições presidenciais de 2022 afirma que o 7 de setembro de 2021 revelou 2 elementos centrais que incriminaram Bolsonaro. Segundo a PF, em seus discursos nos atos de Brasília e São Paulo, o ex-presidente ameaçou instituições. Diante da repercussão negativa, preparou um plano de fuga.

ameaças: Bolsonaro chamou as urnas de “farsa” e investiu contra ministros do Supremo; na capital paulista, falou em “enquadrar” outros Poderes e insinuou uma ruptura institucional, ao dizer que não obedeceria mais decisões judiciais de Alexandre de Moraes; para a PF, os discursos serviram para radicalizar apoiadores e abrir espaço para um golpe de Estado;
plano de fuga – o inquérito afirma que, diante do risco de reação às ameaças, Bolsonaro e o então ajudante de ordens, Mauro Cid, montaram um plano de evasão; a estratégia era criar estruturas chamadas “Rede de Auxílio à Fuga e Evasão” e “Linha de Auxílio à Fuga e Evasão”; a ideia era retirar o presidente do país em caso de uma contraofensiva do Judiciário.

Para a PF, o episódio mostrou que o confronto de Bolsonaro com as instituições, naquele ano de 2021, não foi apenas retórico: fazia parte de um roteiro planejado que chegava ao ponto de prever a fuga de um presidente em exercício. 

Sérgio Lima/Poder360 – 7.set.2021

Manifestantes se unem na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, para protestar a favor do presidente Jair Bolsonaro durante evento do 7 de setembro

Denúncia da Procuradoria Geral

O relatório da PF foi usado pela PGR (Procuradoria Geral da República) para apresentar a denúncia de tentativa de golpe ao STF. O procurador-geral da República, Paulo Gonet, sustenta na peça de acusação que o 7 de setembro de 2021 foi usado por Bolsonaro como palanque para confrontar instituições, ameaçar ministros do Supremo e insuflar apoiadores. 

Segundo a peça acusatória, o episódio reúne 4 elementos centrais:

discurso agressivo e ameaças: em São Paulo, Bolsonaro usou o 7 de setembro para investir contra contra o STF, com “palavras viperinas” dirigidas a Moraes;
propósito de desobediência: no mesmo palanque, afirmou que não mais se submeteria a decisões da Corte, apostando no respaldo das Forças Armadas;
ação planejada: segundo a Polícia Federal, o pronunciamento não foi um “arroubo impensado”; o entorno de Bolsonaro já discutia estratégias que incluíam até mesmo um plano de fuga do país caso não obtivesse apoio militar; 
estratégia criminosa mais ampla: o 7 de setembro é descrito como peça de um projeto maior para corroer a democracia; o ex-presidente teria usado o simbolismo da data para mobilizar apoiadores contra o STF e o TSE, mirando alvos específicos para fragilizá-los perante a opinião pública e abrir espaço para medidas de força.

Ao defender a condenação de Bolsonaro e outros 7 réus, Gonet afirmou na 3ª feira (2.set) que o ex-presidente usou o 7 de setembro de 2021 como marco. Segundo ele, os discursos em Brasília e em São Paulo, no Dia da Independência, marcaram um “novo patamar de radicalização” na estratégia golpista.

A atitude do ex-presidente, segundo a PGR, é uma prova de que o político cometeu “grave ameaça”, condição para que 2 crimes sejam configurados: tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, realizada com “violência ou grave ameaça”, e tentativa de golpe de Estado, em que “violência ou grave ameaça” também aparece.

Assista à fala de Gonet durante julgamento (4min:57s):

A escalada seguiu cronologia específica, conforme a PGR:

29 de julho de 2021: Bolsonaro assegurou em live que as Forças Armadas “estariam prontas para agir a qualquer tempo”;
3 de agosto de 2021: durante entrevista, o ex-presidente sugeriu “medidas de força contra o Poder Judiciário”, afirmando ser necessário “um último recado” para o ministro Barroso;
4 de agosto de 2021: em live, transmitida também na Jovem Pan, Bolsonaro reiterou alegações infundadas sobre as urnas eletrônicas e acusou o TSE de acobertar supostas fraudes. Chamou o ministro Barroso de “mentiroso”;
7 de setembro de 2021: o ápice da escalada, segundo Gonet, ocorreu no Dia da Independência, quando Bolsonaro elevou o tom das ameaças ao se referir ao então presidente do STF, Luiz Fux. “Ou o chefe desse poder enquadra o seu ou esse poder pode sofrer aquilo que não queremos”, declarou durante discurso na Paulista.

Fonte: https://www.poder360.com.br/poder-justica/entenda-como-o-7-de-setembro-se-voltou-contra-bolsonaro/

Deixe um comentário