Oferta pública inicial mais recente na B3 é de 2021; juros altos e falta de confiança por causa de gastos públicos altos atrapalham
O mercado de ações brasileiro começa mais um ano sem perspectivas de ampliar o número de empresas em negociação. Não há, por ora, planos de IPOs (sigla em inglês para Oferta Pública de Ações) em 2025, apesar do PIB (Produto Interno Bruto) em expansão.
Em 2024, completaram-se 3 anos seguidos sem oferta pública. O IPO mais recente na B3 foi em 2021, o da operadora de logística Wilson Sons.
Os juros altos e a turbulência dos ativos financeiros afastam novas aberturas. A Selic, taxa básica de juros, está acima de 10% desde fevereiro de 2022. Não há expectativa de queda abaixo desse patamar antes de 2026.
QUEDA DE 54,6%
Os papéis dos IPOs mais recentes tiveram forte queda na Bolsa. As ações lançadas em 2020 e em 2021 têm recuo de 54,6% na mediana até o fim de 2024. O levantamento de Einar Rivero, CEO da consultoria Elos Ayta, considerou os ativos que sobreviveram ou que não passaram por fusão.
Só 14 superam o Ibovespa, principal índice das ações negociadas na B3. Menos de 21% ofertas públicas iniciais que estão em negociação na B3 tiveram desempenho melhor que o índice.
Em entrevista ao Poder360, o sócio da PwC Brasil Kieran MacManus disse que a seca de 3 anos se deve, além do cenário internacional mais complexo, à taxa de juros crescente do Brasil.
“É possível ver um aumento dramático na taxa de juros do Brasil, que criou uma alternativa para a renda fixa de quem quer investir”, disse.
Segundo MacManus, aplicações menos voláteis se tornam opções mais atrativas e seguras, o que freou os anúncios de IPOs. Afirmou que a oferta de ações teria que ser muito boa para contrapor o nível de juros elevados atual.
O especialista disse que há empresas que querem fazer IPOs, porque a atividade econômica do Brasil demonstra força. Segundo ele, caso haja uma perspectiva de queda de juros, será possível prever a volta das ofertas públicas iniciais no Brasil.
“No curto prazo, se for mantida essa expectativa para 2025 [de juros em alta] […] vai criar um viés negativo para [IPOs] em 2025. O ponto é que, ainda que aconteça isso em 2025, em 2026 [os juros] vão reduzir. Não tem como manter esse nível de juros. Todas as projeções mostram que, depois disso, vai cair”, declarou.
“Na medida que estamos em 2025 e já estamos enxergando o final dessas taxas altas de juros, o mercado muda rapidamente”, completou.
CONTAS PÚBLICAS
MacManus disse que a volta do Brasil para o grau de investimento possibilitaria o fim da seca dos IPOs. A Moody’s elevou a nota de Ba2 para Ba1, deixando o país a um passo do grau de investimento.
Apesar disso, o pacote fiscal apresentado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, frustrou os agentes do mercado financeiro. O dólar e os juros futuros subiram.
MacManus disse esperar que a instabilidade passe. “Estamos numa fase em que teve variações negativas no final do ano, mas o mercado do Brasil é volátil e tem capacidade de responder rápido a indicadores positivos”, disse.
ANÁLISE DO PODER360
A seca de IPOs é uma das indicações mais fortes da falta de confiança nas decisões econômicas do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O presidente afirmacom frequência que a responsabilidade fiscal é uma meta de seu governo.
Os números dizem o contrário. O setor público teve em dezembro de 2024 o 8º deficit acumulado em 12 meses acima de R$ 1 trilhão.
Os cortes que o ministro Fernando Haddad (Fazenda) anunciou em novembro tinham o objetivo de melhorar as expectativas quanto ao controle das contas públicas. Em vez disso, houve piora. Analistas de mercado avaliaram que as medidas foram insuficientes.
Lula menciona o histórico de responsabilidade de seus governos anteriores (2003 a 2010). Mas na época conseguia superavit das contas públicas. A dívida pública caiu e a confiança cresceu. O número de IPOs chegou a 64 em 2007. Mesmo com a crise global do ano seguinte, houve 4. Depois, o número voltou a subir.
A prosperidade não se limitou aos mercados financeiro e de capitais. Espraiou-se por toda a economia, com aumento de renda generalizado. A popularidade de Lula cresceu muito naquele período.
Pode-se argumentar que a situação atual não permite medidas de austeridade porque o governo tem baixa popularidade. É difícil esperar que a falta de austeridade fiscal melhore o quadro.
Fonte: https://www.poder360.com.br/poder-economia/bolsa-nao-tem-perspectiva-de-ipo-apos-3-anos-de-seca/