Guerras redesenham rotas e viram desafio para aviação civil

Conflitos criam “céus minados” e forçam as companhias aéreas a estarem preparadas para interferências em sistemas de voo

A guerra entre Irã e Israel no Oriente Médio criou complicações para as companhias aéreas, que buscam evitar o espaço aéreo regional e, ao mesmo tempo, cumprir a proibição vigente sobre o espaço aéreo russo.

Embora o espaço aéreo do Irã tenha sido parcialmente reaberto depois de um cessar-fogo, os dados do site de rastreamento de voos flightradar24 mostram que as companhias aéreas ocidentais ainda estão evitando voar sobre o país. A maioria está escolhendo rotas que contornam a fronteira ocidental iraniana, através do espaço aéreo iraquiano ou sobre a Península Arábica.

O caso da Rússia, que impede a entrada de aviões ocidentais em seus céus desde o início da guerra contra a Ucrânia no começo de 2022, é o exemplo mais recente de como uma era de conflitos globais crescentes está afetando o setor de aviação.

Outro exemplo se deu em abril, quando o Paquistão fechou seu espaço aéreo para as companhias indianas depois que a Índia lançou ataques com mísseis contra o Paquistão, em uma campanha militar com o codinome Operação Sindoor. Embora as aéreas ocidentais não estejam impedidas de entrar no espaço aéreo paquistanês, a maioria delas prefere evitá-lo.

Analista de aviação baseado em Cingapura, Brendan Sobie diz não ser novidade o fato de as companhias aéreas terem que mudar de rota por causa de conflitos, mas que a situação está especialmente “complicada” no momento. “Já aconteceu algumas vezes de termos vários pedaços de espaço aéreo próximos uns dos outros fechados ao mesmo tempo”, disse à DW.

Negócio arriscado

John Grant, analista-chefe da empresa de dados de aviação OAG, concorda haver “muito mais atividade” no momento. Diz que o fechamento do espaço aéreo entre o Paquistão e a Índia é um problema específico para a Air India, pois obriga os aviões da empresa a fazer uma parada durante as viagens para os EUA.

Segundo Grant, a situação no Oriente Médio é “definitivamente um problema”, mas as aéreas têm se “ajustado bem”, especialmente ao sobrevoar a Península Arábica.

“É óbvio que alguns passageiros na Arábia Saudita estão muito mais ocupados do que normalmente, mas isso não atrapalhou os horários dos voos”, diz. “As aeronaves ainda estão chegando e partindo pontualmente, e o setor continua a administrar seu caminho.”

Na opinião de Grant, as complicações causadas por conflitos armados fazem parte da imprevisibilidade geral enfrentada o tempo todo pelos gerentes das companhias aéreas.

“Se pensarmos em 4 ou 5 anos atrás, as companhias aéreas tiveram que lidar com uma pandemia, que foi muito pior do que qualquer outra coisa”, diz, acrescentando que não acredita que os desafios operacionais deste ano sejam muito diferentes dos da última década.

“Acho que todo CEO de companhia aérea provavelmente acorda todas as manhãs, ou pelo menos seu diretor de operações de voo acorda e se pergunta qual será o próximo evento ou atividade em dois anos que terá de ser gerido e trabalhado.”

Preocupações com a segurança

Em termos de resultados comerciais, Sobie diz que, geralmente, os voos de curta distância são os mais afetados, como se deu, por exemplo, com as rotas entre os países da Ásia Central e do Oriente Médio depois do fechamento do espaço aéreo iraniano.

“Essas rotas tendem a ser curtas, de duas ou 3 horas, e passam a ser de 5 ou 6 horas, porque geralmente quase todo o voo passa sobre o Irã, e é preciso dar a volta completa”, afirma Sobie.

Ele acrescenta que os repetidos fechamentos do espaço aéreo “podem ser bastante caros” por causa dos voos mais longos e do risco de cancelamento de voos relacionados à alteração das rotas. “Tudo isso aumenta o custo.”

Grant acredita que as companhias aéreas europeias tiveram 3 anos para se adaptar à proibição do espaço aéreo russo e, em grande parte, conseguiram lidar com isso. Mas outros fatores, como o aumento dos impostos ambientais, têm impacto igualmente prejudicial sobre as companhias aéreas, tornando as operações “muito caras”, com o custo resultante sendo “repassado para o viajante”.

No entanto, a percepção de que o conflito global está afetando a segurança da aviação é claramente uma preocupação.

“O recente conflito no Oriente Médio, compreensivelmente, fez com que os passageiros questionassem quais medidas estão em vigor para manter o voo seguro quando há atividades militares, incluindo lançamentos de mísseis”, disse Nick Careen, vice-presidente sênior de operações, segurança e proteção da IATA (Associação Internacional de Transporte Aéreo) – organização internacional das companhias aéreas –, em artigo no final de junho para o site da entidade, se referindo à queda do voo 8243 da Azerbaijan Airlines em dezembro de 2024.

As investigações sugerem que o voo da Azerbaijan Airlines foi abatido por um míssil russo.

“GPS spoofing” uma preocupação real

Careen levantou a questão específica da interferência nos sistemas de navegação dos aviões como “uma complicação adicional”.

Houve um “aumento nos incidentes”, disse ele, em que “as partes em conflito usam sinais de rádio para bloquear os sinais de GPS que os aviões usam para navegação”, especialmente em áreas que fazem fronteira com zonas de conflito.

O mapa de interferência de GPS do Flightradar24 mostra o mundo dividido em áreas de baixa e alta interferência de GPS. A área com o nível mais alto de interferência é um círculo que se estende dos Estados Bálticos, passando pela Ucrânia e pela Rússia, até a Turquia e partes do Oriente Médio.

Grant observa que a interferência do GPS é “outro risco em potencial” para o setor aéreo, mas acrescenta que as companhias aéreas estão “extremamente conscientes disso e têm mais de um sistema para navegar por esses trechos do espaço aéreo”.

Um estudo do OPS Group, organização internacional de profissionais de operações de voo, relatou um aumento de 500% no chamado “GPS Spoofing” de 2023 a 2024. O spoofing de GPS é quando um receptor de GPS é manipulado e recebe informações falsas.

Grant acredita que a prática está, sem dúvida, aumentando, mas adverte que as companhias aéreas têm mecanismos robustos para se proteger contra os riscos que ela representa. “Todo o setor trabalha com base na minimização de todos os riscos potenciais”, diz ele. “As companhias aéreas são muito boas em controlar o que podem controlar. Mas sempre há fatores incontroláveis.”

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Fonte: https://www.poder360.com.br/poder-internacional/guerras-redesenham-rotas-e-viram-desafio-para-aviacao-civil-dw/

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