Eleitos que se identificam com essa etnia nos Executivos estaduais e municipais bateram recorde em 2022, mas lentidão expõe baixa representatividade
O total de indígenas eleitos para cargos públicos no Brasil ainda é baixo, mas bateu recorde nas eleições recentes.
Nos Executivos estadual (governadores) e municipal (prefeitos), 24 indígenas conquistaram mandatos de 2014 a 2022. Na Câmara, o número de deputados eleitos que se autodeclarou dessa forma passou de zero para 6 no período.
Os dados citados acima são de autodeclarações fornecidas pelos candidatos ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Não há informações sobre cor de pele para antes de 2014.
Apesar do crescimento, o avanço ainda é tímido diante da população indígena brasileira, de 0,83% do total de habitantes do país (ou 1.693.535 pessoas), segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
A porcentagem de indígenas eleitos nos Executivos estaduais e municipais foi de 0,14% de 2014 a 2022. Das 16.786 vagas disputadas, só 24 foram ocupadas por candidatos que declararam ter essa etnia.
No mesmo período, foram 1.539 cadeiras disputadas na Câmara (513 em cada uma das 3 eleições). Só em 0,39% desse total foi eleito um indígena.
A reportagem analisou só os candidatos com autodeclaração de cor registrada no TSE e desconsiderou vices e suplentes eleitos.
BRANCOS SEGUEM NA MAIORIA
O estudo “Lideranças Negras no Estado Brasileiro (1995-2024)”, produzido pelo Afro-Cebrap (Núcleo de Pesquisa e Formação em Raça, Gênero e Justiça Racial), define o percentual de não brancos (negros, pardos e indígenas) em cargos de alta, média e baixa liderança no Executivo Federal. Eis a íntegra (PDF – 3 MB).
A pesquisa considera 3 categorias de líderes:
alta (posições iguais ou acima de direção e de subsecretária e cargos de natureza especial);
média (titulares de serviço ou unidade até a coordenação geral);
baixa (cargos comissionados e funções de confiança de menor hierarquia).
De todos os cargos de liderança analisados, 39% são ocupados por não brancos. Esse número subiu 17 pontos percentuais nos últimos 25 anos.
Nos cargos de alta liderança, os percentuais são menores: 16% são ocupados por homens não brancos e 11% por mulheres não brancas.
AVANÇOS LENTOS
Para o professor da Ufam (Universidade Federal do Amazonas) Raimundo Nonato, especialista em movimentos indígenas, o crescimento tem “influência na conquista e ampliação de espaço de representação política”.
“Os números são positivos. Isso tem influência na conquista e ampliação de espaço de representação política, mas visto que a quantidade de indígenas em muitas cidades é diminuta, eles são baixos em relação à população em geral”, afirma.
Segundo o professor, o voto identitário, ou seja, o voto de indígenas em indígenas “tem peso político” e influencia o resultado. Para ele, o crescimento é “positivo” e a autodeclaração demonstra “um processo de ruptura gradual com o sistema que os negligencia”.
Ainda assim, na avaliação de Nonato, a falta de articulação entre os eleitos ligados à pauta indígena “cria barreiras que inviabilizam o aumento do capital indígena no mercado eleitoral”.
MARCOS NA POLÍTICA
O 1º indígena a ocupar cargo e tomar posse no Legislativo foi Mário Juruna, deputado federal filiado, à época, ao PDT e eleito pelo Estado do Rio de Janeiro. Juruna esteve no Congresso de 1983 e 1987. Não se reelegeu.
Em 2018, Joenia Wapichana (Rede) foi a 1ª mulher indígena eleita para a Câmara dos Deputados. Também não conquistou a reeleição. Em 2022, 4 anos depois, o Brasil elegeu seu 1º governador indígena, segundo o TSE: Jerônimo Rodrigues (PT), na Bahia.
Wellington Dias (PT) foi governador do Piauí por 4 mandatos (2002, 2006, 2014 e 2018) e eleito senador em 2010 e 2022. Em 2023, assumiu o cargo de ministro do Desenvolvimento Social no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Ele diz ter origem indígena, mas se declara ao TSE como pardo. Já foi chamado de “índio” por Lula.
No 3º mandato, Lula criou o Ministério dos Povos Indígenas. Ele nomeou a deputada federal Sonia Guajajara (Psol) para o comando da pasta. A congressista é considerada uma das principais líderes indígenas no país.
Esta reportagem foi escrita pelo trainee do Poder360 Gabriel Lopes sob a supervisão do editor sênior Rafael Barbosa e da editora-assistente Isadora Albernaz.