Para especialistas em direito ambiental, declaração pode incentivar buscas no mercado ilegal; Ibama não se pronunciou
A declaração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre comer ovos de emas e de jabutis pode ser interpretada como um crime ambiental. É a avaliação de especialistas em direito ambiental consultados pelo Poder360 (leia mais abaixo).
Eis o que disse Lula em 13 de fevereiro de 2025:
“Eu to comendo agora ovo de pata, que diz que tem mais sustância, e como eu sou um jovem de 79 anos, eu tenho que comer muito ovo de pata. Ovo de galinha fica para vocês que são jovens. Eu estou comendo agora ovo de ema! O ovo de ema é desse tamanho e equivale a 12 ovos de galinha. Fui pesquisar se eu podia comer e eu posso comer, porque tenho 70 emas no Palácio da Alvorada e elas botam ovo do tamanho da cabeça de vocês […] Qualquer dia eu vou comer ovo de jabuti também.”
Assista ao vídeo com a declaração de Lula (1min16s):
A seguir, leia o que diz trecho da Lei de Crimes Ambientais:
“quem vende, expõe à venda, exporta ou adquire, guarda, tem em cativeiro ou depósito, utiliza ou transporta ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre, nativa ou em rota migratória, bem como produtos e objetos dela oriundos, provenientes de criadouros não autorizados ou sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente”.
A pena é de 6 meses a 1 ano de prisão, além de uma multa de R$ 5.000 por ovo coletado sem autorização, para as espécies de aves ameaçadas de extinção. Não é o caso das emas. Como os animais não correm esse risco, a multa é de R$ 500.
Há outro trecho do mesmo artigo (de nº 29), no entanto, que diz que “no caso de guarda doméstica de espécie silvestre não considerada ameaçada de extinção, pode o juiz, considerando as circunstâncias, deixar de aplicar a pena”. Ou seja, se o tutor de uma ema ou de um jabuti decidir consumir os ovos dos animais, a Justiça pode decidir não puni-lo.
O artigo 225 da Constituição Federal define a fauna brasileira como patrimônio nacional e coloca sob o Estado a responsabilidade de manter a segurança da fauna silvestre no Brasil.
O Poder360 apurou que o Palácio do Planalto tem autorização do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) para ser um criatório conservacionista com a finalidade de criar, reproduzir e manter espécimes da fauna silvestre em cativeiro. As emas ficam no Alvorada, residência oficial da Presidência da República, já os jabutis, na Granja do Torto, casa de campo oficial da Presidência.
O QUE DIZEM OS ESPECIALISTAS
Para o especialista em direito ambiental Alessandro Azzoni, tirar os ovos das emas da natureza e consumi-los, como Lula disse, seria considerado crime ambiental com efeito “destruidor da fauna brasileira”.
Segundo a advogada especialista em direito ambiental Samanta Pineda, a declaração poderia ter esse efeito porque pode ser interpretada como um “incentivo” à procura de ovos de ema ou de jabutis no mercado ilegal.
O especialista em direito penal ambiental Pedro Bueno de Andrade discorda. Afirmou que, “partindo da premissa” de que a criação de emas no Palácio da Alvorada tem a autorização dos órgãos responsáveis, o consumo dos ovos dos animais “não parece” ser crime. Isso porque a legislação pune essa conduta somente quando os animais estão na natureza ou em criadores ilegais.
O QUE DIZ O IBAMA
O Poder360 entrou em contato com o Ibama na 2ª feira (17.fev) para perguntar se a declaração de Lula sobre comer ovos de emas e de jabutis seria considerada crime. Pediu um posicionamento todos os dias ao longo da semana. Não houve resposta até a publicação desta reportagem. O texto será atualizado caso uma manifestação seja enviada a este jornal digital.
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Esta reportagem foi produzida pelo estagiário em jornalismo Davi Alencar sob a supervisão do chefe de Redação, Brunno Kono.